Se entre vogais s vale z, o porquê de cozinha
e certeza se escreverem com z e não s e o porquê de casa se escrever com s e não com z? Porquê, por exemplo, vaso, casinha, casita, vasito com s entre duas vogais e porquê, por exemplo, leãozinho, leãozito, cãozinho?
A ortografia do português, como a ortografia de qualquer língua, é um conjunto de regras
convencionadas e artificiais que procuram reflectir o sistema fonológico e
morfológico da língua, em muitos casos com invocação de motivos etimológicos,
desconhecidos da maioria dos utilizadores da língua. Por este motivo, são
normalmente os utilizadores da língua que mais lêem e escrevem quem melhor
domina a ortografia, por desenvolverem uma memória e uma prática ortográfica.
A ortografia portuguesa só começou a ter alguma estabilidade a partir do final
do séc. XIX, com o início das reformas ortográficas. A instabilidade anterior a
esta altura poderá facilmente ser verificada em textos antigos, em dicionários
etimológicos ou em dicionários com formas históricas, como o Dicionário
Houaiss (edição brasileira da Editora Objetiva, 2001; edição portuguesa do
Círculo de Leitores, 2002). Poderá verificar, por exemplo, que a grafia de
casa se encontra atestada como casa em 1221, como quasa, em
1278, como caza, em 1352 ou como cassa, no séc. XIV. Este é apenas
um exemplo, mas é possível encontrar casos afins, até no séc. XX, de grafias que
nos parecerão muito estranhas, atendendo à ortografia actual, fixada sobretudo a
partir da década de 40 do séc. XX, com o
Acordo Ortográfico de 1945, para o português europeu e com o Formulário
Ortográfico de 1943, para o português do Brasil.
A juntar a estes factores, e também decorrente deles, há o facto de a relação
entre os sinais gráficos (as letras) e os sons por eles representados não serem
unívocos. Para uma letra (ex.: s) pode então haver várias pronúncias (ex.:
[s] em sal, [z] em casa, [S]
em cais, [Z]
em mesmo) e para um som (ex.: [s]) pode haver várias grafias (ex.
sal, massa, macio, coçar, trouxe).
Apesar do que foi dito anteriormente, há ortografias que decorrem de processos
regulares de derivação etimológica, em muitos casos a partir do latim. Desta
forma, o facto de a letra -s- se pronunciar [z] em contextos
intervocálicos não invalida que a letra -z- possa ocorrer nesses mesmos
contextos, por motivos etimológicos, sobretudo ligados à transformação, na
passagem do latim ao português, de consoantes oclusivas latinas (o -c-
latino tinha valor de [k]) em consoantes sibilantes antes das letras -e-
e -i- (ex.: gallicia > galiza; judiciu(m) > juízo; luce(m) > luz;
minacia > ameaça). Este fenómeno, designado assibilação, é comum a várias
línguas neolatinas (ex.: judiciu(m) > judicieux [francês], juicio
[espanhol]; minacia > menace [francês], amenaza [espanhol]).
Os últimos exemplos apresentados na dúvida colocada são diminutivos e apresentam
dois sufixos distintos apostos à palavra ou ao radical. Nos casos de cão
> cãozinho e de leão > leãozinho,
leãozito, são utilizados os sufixos -zinho ou -zito.
Nos casos de casa > casinha,
casita e de vaso > vasito,
aos radicais de cada uma das palavras foram acrescentados os sufixos -inho
ou -ito e o -s- que aparece nestas palavras pertence ao radical e
não ao sufixo diminutivo. Sobre os sufixos diminutivos, consulte ainda a
resposta diminutivos (I).
Gostaria de saber a etimologia e significado da palavra Fontoura, que, ao que sei, para além de nome é igualmente uma localidade nas Astúrias. E ainda a etimologia de Gouveia, igualmente nome próprio e localidade.
De acordo com o Dicionário Onomástico Etimológico da Língua Portuguesa, da autoria de José Pedro Machado (Lisboa, Livros Horizonte, 2003), o topónimo Fontoura, que dá o nome a localidades nas regiões de Carrazeda de Ansiães, Ílhavo, Lamego, Ponte de Lima, Resende, Valença, Vila do Conde, Vila Nova de Gaia, Vila Verde e Galiza, terá origem no latim Fonte Aurea, que significa “fonte dourada”.
O topónimo Gouveia, com ocorrência em Portugal e no Brasil, é de origem
incerta, mas José Pedro Machado põe a hipótese de estar relacionado com o
antropónimo Gaudila.
Os apelidos Fontoura e Gouveia terão origem nos respectivos
topónimos.