Gostaria de saber
como se emprega ...asse ou ...-se.
A questão que nos coloca parece dizer respeito à diferença
entre 1) as formas da primeira e terceira pessoas do singular do
pretérito imperfeito do conjuntivo (ou subjuntivo, no Brasil) de verbos de tema em -a- (ex.: lavar -
Se eu lavasse o casaco com água, ele estragava-se) e em -e-
(ex.: comer - Esperava que ele comesse a sopa toda; Não
queria que ele vendesse a casa) e 2) as formas da
terceira pessoa do singular do presente do indicativo dos mesmos verbos,
seguidas do pronome pessoal átono se (ex.: Ele lava-se
todos os dias; Come-se bem neste
restaurante; Vende-se este carro).
Os exemplos acima indicados (lavasse/lava-se;
comesse/come-se e vendesse/vende-se) são formas parónimas,
isto é, escrevem-se e pronunciam-se de forma semelhante (mas não igual), tendo,
porém, significados diferentes.
Uma estratégia importante para empregar correctamente estas formas diferentes é
analisar o contexto em que estão inseridas. Vejamos então os contextos do
conjuntivo de 1) e do pronome pessoal de 2):
1) O pretérito imperfeito do conjuntivo é um tempo verbal usado
para expor um desejo/pedido num tempo passado ou atemporal (ex.: Esperava que
ele comesse a sopa toda; Não queria que ele vendesse
a casa) ou uma possibilidade/hipótese no passado ou num momento atemporal (ex.: Se eu gostasse de viajar, já a tinha visitado;
Pediu-lhe para não conduzir, caso bebesse). Trata-se sempre,
nestes casos, de uma palavra só, pois corresponde apenas a uma forma verbal.
Do ponto de vista da pronúncia, estas formas verbais têm sempre o acento tónico
da palavra na penúltima sílaba (ex.: bebesse, comesse,
gostasse, vendesse).
2) As formas da terceira pessoa do singular do presente do indicativo
seguidas do pronome pessoal átono se podem corresponder a 3 tipos de
estruturas diferentes. Trata-se sempre, em qualquer destes três casos, de duas
palavras, um verbo no presente do indicativo e um pronome pessoal.
Do ponto de vista da pronúncia, e também nestes três casos, estas formas verbais
têm sempre o acento tónico da palavra na penúltima sílaba (ex.: bebe,
come, gosta, vende), mas como há um pronome pessoal
átono a seguir, é como se a construção verbo+pronome fosse uma palavra só,
acentuada sempre na antepenúltima sílaba (ex.: bebe-se, come-se,
gosta-se, vende-se).
As três estruturas pronominais diferentes são as seguintes:
2.1) Forma da terceira pessoa do indicativo seguida de um pronome
pessoal átono reflexo se. Neste caso, o sujeito faz uma acção sobre
si próprio (ex.: Ele lava-se todos os dias.).
Para nunca confundir esta construção com formas do pretérito imperfeito do
conjuntivo, poderá, no mesmo contexto e com o mesmo sentido, substituir o
sujeito, a forma verbal e o pronome se por outra pessoa gramatical (ex.
Ele lava-se --> Tu lavas-te, logo
trata-se de verbo+pronome pessoal reflexo).
2.2) Forma da terceira pessoa do indicativo seguida de um pronome
pessoal átono
que desempenha a função de sujeito indefinido ou indeterminado, com um valor
próximo de a gente ou alguém (ex.: Come-se bem neste restaurante).
Para nunca confundir esta construção com formas do pretérito imperfeito do
conjuntivo, poderá, no mesmo contexto e com o mesmo sentido, substituir o
pronome se por outro sujeito como a gente ou alguém
(ex.: Come-se bem neste restaurante --> A gente come
bem neste restaurante, logo trata-se de verbo+pronome pessoal
sujeito indefinido).
2.3) Forma da terceira pessoa do indicativo seguida de um pronome
pessoal átono apassivante se, com um valor próximo de uma frase
passiva (ex.: Vende-se este carro).
Para nunca confundir esta construção com formas do pretérito imperfeito do
conjuntivo, poderá, no mesmo contexto e com o mesmo sentido, substituir o
pronome se por uma construção passiva (ex.: Vende-se este
carro --> Este carro é vendido, logo trata-se de verbo+pronome
pessoal apassivante).
É correcta a frase As PME's enfrentam dificuldades?
Existe plural de PALOP e de TIC?
A flexão das siglas
e dos acrónimos coloca frequentemente dúvidas aos utilizadores da língua, assim
como a flexão das abreviaturas e dos símbolos. Neste contexto, é útil esclarecer
cada um destes termos, para poder obter uma resposta coerente às dúvidas sobre
flexão em número.
Uma sigla é um conjunto formado pelas letras iniciais de várias palavras
(ex.: PME = Pequena e Média Empresa), usado
como uma única palavra pela soletração das letras que o compõem (ex.: P = [pe], M
= [Èmi], E = [È]); como tal, pode
também corresponder ao plural de uma ou mais dessas palavras, sem que as
iniciais se alterem (ex.: EUA, por exemplo, é uma sigla que corresponde a
um plural, Estados Unidos da América,
sem que seja necessário uma marca dessa flexão). Por este motivo, não haverá
razão lógica para acrescentar um esse (-s) às siglas referidas: deverá
escrever-se os CD (os Compact Discs) ou as PME
(as Pequenas e Médias Empresas).
Um acrónimo é um conjunto formado pelas letras iniciais de várias
palavras (ex.: EPAL), usado como uma única palavra e pronunciado não pela
soletração de cada uma das letras, como as siglas, mas de forma contínua, como
um nome comum (ex.: EPAL lê-se [È'pal] e não [Èpea'Èli]).
Assim, pelo mesmo motivo apontado para as siglas, deverá escrever-se os PALOP
(os Países Africanos de Língua Oficial Portuguesa)
ou as TIC (as Tecnologias de Informação e Comunicação).
Ainda em relação aos acrónimos, deve dizer-se que estes se transformam por vezes
em nomes comuns (ex.: sida < Síndrome de Imunodeficiência
Adquirida, cedê < CD < Compact Disc), obedecendo às
regras gerais de ortografia e assumindo então as regras gerais de flexão (ex.:
A sida em África é diferente das outras sidas?; Comprou vários cedês.).
Uma abreviatura corresponde a uma letra ou a um conjunto de letras que
faz parte de uma palavra e a representa na escrita (ex.: Dr. < Doutor),
mas que não tem em geral um correspondente fonético (a abreviatura Dr.
ler-se-á doutor e não como [dri] ou com soletração das letras
[de'ÈRi]), sendo que muitas
vezes estas abreviaturas admitem as marcas de flexão, entendendo-se que
constituem abreviaturas de palavras diferentes (ex.: Dr.ª, Dr.as).
Um símbolo
corresponde a uma letra ou a um conjunto de letras que estabelece, geralmente
por convenção, uma relação de correspondência com uma unidade de medida (km
= quilómetro(s); V = volt(s); Y = ítrio) ou um conceito (cos =
cosseno, SO = sudoeste), não havendo geralmente um correspondente
fonético (ex.: V ler-se-á volt), nem marcação de flexão (ex.:
corrente de 220V ler-se-á volts), pois trata-se muitas vezes de
símbolos estabelecidos internacionalmente ou com um valor bastante difundido,
nomeadamente em áreas científicas, e têm de ser únicos e unívocos.
No caso das siglas,
acrónimos e abreviaturas, é muito usual o uso das marcas de flexão em alguns
casos, nomeadamente com adjunção de -s no final (ex.: PMEs). Tal
uso, não sendo proscrito pelas regras de ortografia portuguesa (o acordo
ortográfico em vigor é omisso nesse aspecto), carece de motivo lógico, como
acima foi defendido e obrigaria, por exemplo, no caso de se considerar que se
trata de uma aplicação das regras gerais de flexão, a adaptações ortográficas no
caso de siglas ou acrónimos terminados em consoantes (ex.: PALOPes).
O apóstrofo ou a plica antecedendo o -s (ex.: *PME’s) não deverá ser
usado, pois não é um mecanismo de flexão da língua portuguesa.