Qual é a expressão correcta: ...Em comunicado da Senhora Juiz... ou ...Em comunicado da Senhora Juíza...?
Presentemente, a palavra juiz designa um magistrado do sexo masculino
(ex.: O juiz Roberto declarou aberta a sessão) e a palavra juíza
designa um magistrado do sexo feminino (ex.: A juíza Margarida mandou
evacuar a sala).
A hesitação na utilização do termo masculino juiz para
designar um referente feminino (ex.: A juiz Margarida mandou evacuar a
sala) resulta do facto de esse cargo ter sido, durante muitos anos,
maioritariamente desempenhado por pessoas do sexo masculino, tal como muitas
outras profissões (ex.: senador, presidente, ministro, etc.). As palavras
designativas destes cargos foram sendo registadas na tradição lexicográfica como
substantivos masculinos, reflectindo esse facto.
Porém, à medida que a sociedade
em que vivemos se vai alterando, torna-se necessário designar novas realidades, como seja o caso da feminização
dos nomes de algumas profissões, decorrente do acesso da população feminina a
tais cargos. Por exemplo, as palavras chefe, presidente, comandante
passaram a ser usadas e registadas nos dicionários como substantivos comuns de
dois, ou seja, com uma mesma forma para os dois géneros, sendo o feminino ou o
masculino indicado nos determinantes com que coocorrem, que flexionam em género,
consoante o sexo do referente: havia o chefe e passou a haver a chefe
(veja-se, a este propósito, a dúvida relativa a
capataz).
De igual modo, surgiram juízas, deputadas, vereadoras, governadoras,
primeiras-ministras, engenheiras, etc. No primeiro caso optou-se
por formas invariáveis, no último, por formas flexionáveis. Na origem de um ou
de outro processo parece estar a analogia de palavras com a mesma terminação (no
caso de juiz, as formas o petiz, a petiza) ou o uso que se
vai generalizando.
Pode persistir alguma resistência na aceitação destes termos flexionados. No
entanto, a estranheza inicial de uma forma flexionada como juíza ou
primeira-ministra tem-se esbatido à medida que estas palavras surgem
regularmente na imprensa escrita e falada. Esta mudança da língua é ainda
atestada pelas mais recentes obras lexicográficas em língua portuguesa, como
sejam o Dicionário de Língua Portuguesa Contemporânea (Academia das
Ciências/Verbo, 2001) ou o Dicionário Houaiss da Língua Portuguesa
(edição brasileira da Editora Objetiva, 2001; edição portuguesa do Círculo de
Leitores, 2002), que registam o feminino juíza.
Em resultado do que atrás se disse, a expressão mais adequada é Em comunicado
da Senhora Juíza.
Alguma vez existiu a palavra quisermos com a troca do s pelo z, ou seja quizermos / quizeste?
A grafia correcta do verbo querer nunca tem z em qualquer das suas formas. Se o z surgir, trata-se de um erro ortográfico.
Actualmente, a ortografia da língua portuguesa baseia-se num conjunto de regras estabelecidas em textos legais e obras de referências (normalmente dicionários, vocabulários, gramáticas e prontuários). Na altura em que não havia acordos ortográficos consolidados nem obras de referência acessíveis era mais difícil delimitar erros ortográficos, pelo que, quanto mais recuarmos na história da língua, menos coerência encontraremos. Deste modo, é frequente encontrarmos em textos mais antigos grafias que hoje não são aceites como correctas (não é preciso recuar mais do que à primeira metade do séc. XX), pelo que formas como quizermos ou quizeste podem ter ocorrido, sem que a noção de erro ortográfico estivesse sequer presente. Uma boa ilustração deste facto são as formas históricas apresentadas pelo Dicionário Houaiss da Língua Portuguesa
(edição brasileira da Editora Objetiva, 2001; edição portuguesa do Círculo de
Leitores, 2002) para o verbete querer com várias datações: “897 quesieri, sXIII querer, sXIII quero, sXIII querria, sXIII querian, sXIII quyserõ, sXIV queseres, sXIV quesisti, sXIV quizer, sXIV qujs, sXV quigera, sXV quijese, sXV quixesse, sXV quiz“.