Gostaria de saber das regras para o uso adequado da palavra se.
Para empregar correctamente a palavra se, é necessário analisar e
perceber a diferença entre duas classificações, a de conjunção
subordinativa (em 1) e a de pronome pessoal átono (em 2).
1 Como conjunção, a palavra se surge para ligar frases
subordinadas e pode ter vários valores, que se podem resumir basicamente em:
1.1 Conjunção subordinativa condicional, para indicar uma condição ou uma
hipótese (ex.: Só podem brincar na rua se não chover; Se
chegares atrasado, a responsabilidade é tua).
1.2 Conjunção subordinativa integrante, para iniciar frases
interrogativas indirectas (ex. Perguntou se aquilo era verdade).
2 Como pronome pessoal, a palavra se pode corresponder a
quatro tipos de
estruturas diferentes, estando sempre acompanhada de um verbo (antes ou depois).
2.1 Pronome
pessoal átono reflexo, para indicar o complemento directo
quando a acção do sujeito recai sobre ele próprio (ex.: Vestiu-se
rapidamente.).
2.2 Pronome
pessoal átono recíproco, para indicar o complemento directo sobre o qual
recai uma acção mutuamente realizada e sofrida
por um sujeito
plural ou complexo (ex.: Cumprimentaram-se
respeitosamente.).
2.3 Pronome
pessoal átono
que desempenha a função de sujeito indefinido ou indeterminado, com um valor
próximo de a gente ou alguém (ex.: Lê-se esse livro com
muita facilidade).
2.4 Pronome
pessoal átono apassivante, com um valor próximo de uma frase
passiva (ex.: Arrenda-se loja no centro).
Sobre esta questão, e porque a palavra se é frequentemente
confundida, na ortografia, com a terminação do pretérito imperfeito do
conjuntivo, por favor consulte também outra dúvida relacionada em
pretérito imperfeito do conjuntivo e presente do indicativo
seguido de -se.
Das seguintes, que forma está correcta?
a) Noventa por cento dos professores manifestaram-se.
b) Noventa por cento dos professores manifestou-se.
A questão que nos coloca não tem uma resposta peremptória, originando muitas vezes dúvidas quer nos falantes quer nos gramáticos que analisam este tipo de estruturas.
João Andrade Peres e Telmo Móia, na sua obra Áreas Críticas da Língua Portuguesa (Lisboa, Editorial Caminho, 1995, pp. 484-488), dedicam-se, no capítulo que diz respeito aos problemas de concordância com sujeitos de estrutura de quantificação complexa, à análise destes casos com a expressão n por cento seguida de um nome plural. Segundo eles, nestes casos em que se trata de um numeral plural (ex.: noventa) e um nome encaixado também plural (professores), a concordância deverá ser feita no plural (ex.: noventa por cento dos professores manifestaram-se), apesar de referirem que há a tendência de alguns falantes para a concordância no singular (ex.: noventa por cento dos professores manifestou-se). Nos casos em que a expressão numeral se encontra no singular, a concordância poderá ser realizada no singular (ex.: um por cento dos professores manifestou-se) ou no plural, com o núcleo nominal encaixado (ex.: um por cento dos professores manifestaram-se). Há, no entanto, casos, como indicam os mesmos autores, em que a alternância desta concordância não é de todo possível, sendo apenas correcta a concordância com o núcleo nominal que segue a expressão percentual (ex.: dez por cento do parque ardeu, mas não *dez por cento do parque arderam).
Face a esta problemática, o mais aconselhável será talvez realizar a concordância com o nome que se segue à expressão "por cento", visto que deste modo nunca incorrerá em erro (ex.: noventa por cento dos professores manifestaram-se, um por cento dos professores manifestaram-se, dez por cento da turma reprovou no exame, vinte por cento da floresta ardeu). De acordo com Evanildo Bechara, na sua Moderna Gramática Portuguesa (Rio de Janeiro: Editora Lucerna, 2002, p. 566), esta será também a tendência mais comum dos falantes de língua portuguesa.