Gostaria que me explicassem se a palavra secados (plural de secado) existe. Se a resposta for sim, porque não a encontro em nenhum dicionário?
O verbo secar tem duplo particípio passado: secado e seco. Nos verbos em que este fenómeno acontece, o particípio regular (ex.: secado) é geralmente usado com os auxiliares ter e haver para formar tempos compostos (ex.: a roupa já tinha secado; havia secado a loiça com um pano) e as formas
do particípio irregular (ex.: seco, seca, secos, secas) são usadas maioritariamente com os auxiliares ser e estar para formar a voz
passiva (ex.: a loiça foi seca com um pano; a roupa estava seca pelo vento)
e assumem mais facilmente o papel adjectival (ex.: este bolo ficou demasiado
seco). Por este motivo, é usual não haver flexão do particípio regular, pois
este não é geralmente usado como adjectivo, não flexionando em género, número ou
grau (ex.: *secada, *secados, *secadas; *muito secado; o asterisco
indica agramaticalidade).
Estas
considerações, tomadas da gramática tradicional, têm no entanto muitas
excepções, o que evidencia a problemática da questão e a ausência de respostas
peremptórias para certas questões linguísticas. A título de exemplo, podemos
referir que há verbos cujo particípio abundante não é consensual (com
resoluto e resolvido, por exemplo, não é claro se o primeiro é
particípio irregular de resolver ou adjectivo cognato; relativamente ao
verbo ganhar não é unânime a existência do particípio ganhado a
par de ganho); há verbos cujo particípio regular, ao contrário de
secado, também tem uso adjectival (ex.: confundido, empregado);
há até indicações de alguns gramáticos para diferenças de utilização dos dois
particípios baseadas em critérios semânticos e não sintácticos (por exemplo,
Cunha e Cintra, na Nova Gramática do Português Contemporâneo [Lisboa: Ed.
João Sá da Costa, 1998, p. 442], sugerem que o verbo imprimir só tem
duplo particípio quando significa ‘estampar, gravar’, com o exemplo Este
livro foi impresso em Portugal, e não quando significa ‘imprimir
movimento’, com o exemplo Foi imprimida enorme velocidade ao
carro).
Surgiu-me uma dúvida na conjugação do verbo escrever. Na frase: Não quero com
isto dizer que traduzir um texto seja mais intenso que escreve-lo ou será escrevê-lo?
A dúvida colocada diz respeito à conjugação do verbo escrever (e, em geral, de todos os verbos da segunda conjugação) no infinitivo, seguido de um clítico o.
Este clítico, assim como as suas flexões a, os e as, quando segue
formas verbais terminadas em -r, -s ou -z, apresenta a forma -lo, -la,
-los, -las, com consequente supressão de -r, -s e -z. É por este motivo que se podem encontrar formas como nós
escrevemos o livro --> nós escrevemo-lo; vós escrevíeis essa carta -->
vós escrevíei-la; tu escreveras os textos --> tu escrevera-los.
Em alguns casos há necessidade de adequar a ortografia para manter o som dos
tempos verbais sem o clítico ou para manter a distinção entre tempos verbais. É
o caso de escreve-lo e escrevê-lo, que correspondem a duas formas
distintas do verbo escrever : escreve-lo corresponde à segunda
pessoa do singular do presente do indicativo (ex.: tu escreves o
texto muito bem --> tu escreve-lo muito bem), enquanto
escrevê-lo corresponde ao infinitivo (ex.: é possível escrever
melhor este texto --> é possível escrevê-lo melhor). O
acento circunflexo serve para manter a qualidade da vogal do infinitivo (ex.:
escrev[ê]r --> escrevê-lo; pôr --> pô-lo).
Desta forma, na frase apresentada, a forma correcta seria escrevê-lo,
pois nesse caso trata-se do infinitivo do verbo (Não quero com isto dizer que traduzir um texto seja
mais intenso que escrevê-lo = escrever um texto).
O fenómeno descrito acima é geral para todas as conjugações. Na primeira
conjugação, em -ar (ex.: adorar), para manter o som vocálico aberto
do infinitivo (ex.: ador[á]r) é necessário utilizar o acento agudo (ex.:
adorá-lo); se não apresentar acento, trata-se da segunda pessoa do singular
do presente do indicativo (ex.: tu adora-lo). Na terceira conjugação, em -ir
(ex.: partir), em geral não há necessidade de acentuar graficamente o i
antes do clítico (ex.: parti-lo), pois em português o i tónico
em final de palavra não necessita de acento (excepto em casos em que é
necessário desfazer um hiato; consultar também a dúvida
concluir e pronome -lo), mas neste caso não há confusão com a segunda
pessoa do singular do presente do indicativo (ex.: tu parte-lo).