Gostaria de saber se escrever ou dizer o termo deve de ser é correcto?
Eu penso que não é correcto, uma vez que neste caso deverá dizer-se ou escrever
deverá ser... Vejo muitas pessoas a usarem este tipo de linguagem no seu
dia-a-dia e penso que isto seja uma espécie de calão, mas já com grande
influência no vocabulário dos portugueses em geral.
Na questão que nos coloca, o verbo dever comporta-se como um verbo
modal, pois serve para exprimir necessidade ou obrigação, e como verbo
semiauxiliar, pois corresponde apenas a alguns dos critérios de auxiliaridade
geralmente atribuídos a verbos auxiliares puros como o ser ou o estar
(sobre estes critérios, poderá consultar a Gramática da Língua Portuguesa,
de Maria Helena Mira Mateus, Ana Maria Brito, Inês Duarte e Isabel Hub Faria,
pp. 303-305). Neste contexto, o verbo dever pode ser utilizado com ou sem
preposição antes do verbo principal (ex.: ele deve ser rico = ele deve
de ser rico). Há ainda autores (como Francisco Fernandes, no Dicionário
de Verbos e Regimes, p. 240, ou Evanildo Bechara, na sua Moderna
Gramática Portuguesa, p. 232) que consideram existir uma ligeira diferença
semântica entre as construções com e sem a preposição, exprimindo as primeiras
uma maior precisão (ex.: deve haver muita gente na praia) e as segundas
apenas uma probabilidade (ex.: deve de haver muita gente na praia). O uso
actual não leva em conta esta distinção, dando preferência à estrutura que
prescinde da preposição (dever + infinitivo).
Li o texto do Acordo Ortográfico de 1990 e outros textos sobre o assunto, e tomava a
liberdade de perguntar qual a posição da Priberam relativamente aos prefixos
sub-, ad- e ab- quando seguidos por palavra iniciada por
r cuja sílaba não se liga foneticamente com o prefixo. Concretizando:
sub-rogar ou subrogar; ad-rogar ou adrogar; ab-rogar
ou abrogar? O Acordo, aparentemente, é omisso quanto à matéria, e já
vimos opções diferentes da por vós tomada na versão 7 do FLIP.
O texto legal do Acordo Ortográfico de 1990
(base
XVI) é, de facto, omisso relativamente ao uso de hífen com prefixos
terminados em consoantes oclusivas (como ab-, ad- ou sub-) quando
o segundo elemento da palavra se inicia por r (como em
ab-rogar,
ad-rogar ou
sub-rogar).
Para que seja mantida a pronúncia [R] (como em carro) do segundo
elemento, terá de manter-se o hífen, pois os casos de ab-r, ad-r, ob-r, sob-r,
sub-r e afins são os únicos casos na língua em que há os grupos br ou
dr (que se
podiam juntar a cr, fr, gr, pr, tr e vr) sem que a consoante seja uma
vibrante alveolar ([r], como em caro ou abrir). Se estas
palavras não contiverem hífen, o r ligar-se-á à consoante que o precede e
passará de vibrante velar (ex.: ab[R], sub[R]) a vibrante alveolar (ex.: ab[r],
sub[r]). Não se pode, por isso, alterar a fonética por causa da ortografia, nem
alterar a grafia, criando uma excepção ortográfica, só porque o
legislador/relator ou afim escamoteou ou esqueceu este caso. O argumento de que
a opção de manter o hífen nestes casos segue o espírito do acordo pode
reforçar-se se olharmos, por exemplo, para os casos dos elementos de formação circum- e
pan-, onde não se criam
excepções à estrutura silábica, nem à pronúncia (cf. circum-escolar e não
circumescolar; pan-africano e não panafricano).
Pelos motivos expostos, a opção da Priberam é manter o hífen nos casos
descritos.