Por favor, como se lê Houaiss?
Houaiss é um sobrenome que se divulgou no Brasil e em Portugal sobretudo
devido a Antônio Houaiss, eminente intelectual brasileiro, conhecido sobretudo
como filólogo e como o lexicógrafo que liderou até 1999, data da sua morte, a
concepção do Dicionário Houaiss de Língua Portuguesa, publicado em 2000.
Este apelido, que se tornou também uma marca de produtos lexicográficos (ex.:
Minidicionário Houaiss, Dicionário Houaiss de Verbos, Dicionário Houaiss de
Física), tem origem árabe, pois Antônio Houaiss era filho de imigrantes
libaneses.
A pronúncia de nomes
próprios estrangeiros é normalmente problemática em qualquer língua e o
português não é excepção. A pronúncia mais corrente desta palavra, nomeadamente
no meio em que viveu Antônio Houaiss, é [‘wajs] ou [‘uajs] (nestas transcrições
fonéticas, o símbolo [w] corresponde ao som da letra u em quase,
o símbolo [u] corresponde ao som da letra u em nua,
os símbolos [aj] correspondem ao som do ditongo ai em caixa
e o símbolo [s] corresponde ao som do dígrafo ss em massa).
As palavras árabes necessitam de transliteração para as línguas que utilizam o
alfabeto latino e, neste caso específico, a ortografia do sobrenome Houaiss
reflecte provavelmente a influência da língua francesa na transliteração do
árabe, pois para um som [u] pode corresponder em francês a grafia ou,
como em fou ou coucher, o que não
acontece em português, onde esta grafia corresponde ao som [o], como em
outro ou doutor.
Na geografia, a disparidade de designação é tão grande que só confunde!
Palavras portuguesas antigas como Barém parecem estar a ser substituídas pelo equivalente inglês Bahrein. Outras, como Qatar parecem de formação estranha por anteposição de um q a um a (não conheço mais nenhuma palavra assim formada ...). Já Kosovo escreve-se com k quando o natural seria com c. Ou não?! E como seria Kuwait? Ou Koweit? Há para todos os gostos... E, se Madrid está já consagrada
entre nós sem e no final (Madrid), faz sentido escrever Bagdade
(ou Bagdad)?
O Acordo Ortográfico de 1945 apenas estipula, na sua base LI, que se substituam os topónimos estrangeiros por formas vernáculas sempre que existam formas antigas ou outras de uso corrente. No entanto, é algo frequente hoje em dia a utilização de formas como Bahrein ou Beijing, oriundas
sobretudo do inglês, a língua franca actual, quando já existem na língua portuguesa formas aportuguesadas relativamente antigas, que deverão ser consideradas preferenciais (Barém ou Pequim, respectivamente).
Na base VIII, o acordo também prevê que as letras b, c, d,
g e t se mantenham em fim de palavra em nomes próprios cuja grafia
com essas consoantes finais já tenha sido consagrada pelo uso. Assim se explicam
formas como Madrid ou Bagdad.
No caso de formas como Koweit/Kuwait (a que se pode ainda juntar
Kuweit ou Kowait) ou Qatar, trata-se de uma questão de
transliteração, ou seja, de adaptação ao nosso alfabeto de outros sistemas
gráficos tão diferentes como o árabe. É por vezes difícil fazer a adaptação de
sons de outras línguas que não utilizam o alfabeto latino; acresce ainda o facto
de que frequentemente se adoptam as formas transliteradas para inglês, apesar de
na maior parte das vezes não se adaptarem ao nosso sistema ortográfico ou
fonético. Em alguns casos há tentativas de regularizar estas grafias,
adaptando-as ao português (o Dicionário Houaiss da Língua Portuguesa, por
exemplo, já regista catarense como o gentílico relativo ao Catar, e
coveitiano como uma das formas do gentílico relativo ao Kuwait, a par
de kowaitiano, koweitiano, kuwaitiano e kuweitiano).
Nos casos de nomes próprios que se difundiram mais ou menos recentemente, como
Kosovo, é natural que ainda se escrevam com sequências gráficas estranhas
ao português, pois há uma tendência inicial para se manterem as formas originais
ou as formas da língua pela qual entraram no nosso sistema linguístico. Com o
tempo, é muito provável que essas formas tendam para um aportuguesamento, pelo
que será possível acharmos naturais formas como Cosovo.
O Acordo Ortográfico de 1990 não faz nenhuma alteração em relação a este assunto.