Uma professora minha disse que nunca se podia colocar uma vírgula entre o sujeito e o verbo. É verdade?
Sobre o uso da vírgula em geral, por favor consulte a dúvida
vírgula antes da conjunção e. Especificamente sobre a questão colocada,
de facto, a indicação de que não se pode colocar
uma vírgula entre o sujeito e o verbo é verdadeira. O uso da vírgula, como o da
pontuação em geral, é complexo, pois está intimamente ligado à decomposição
sintáctica, lógica e discursiva das frases. Do ponto de vista lógico e
sintáctico, não há qualquer motivo para separar o sujeito do seu predicado (ex.:
*o rapaz [SUJEITO], comeu [PREDICADO]; *as
pessoas que estiveram na exposição [SUJEITO],
gostaram muito [PREDICADO]; o asterisco indica agramaticalidade).
Da mesma forma, o verbo não deverá ser separado dos complementos obrigatórios
que selecciona (ex.: *a casa é [Verbo], bonita [PREDICATIVO
DO SUJEITO]; *o rapaz comeu [Verbo], bolachas
e biscoitos [COMPLEMENTO DIRECTO]; *as pessoas gostaram
[Verbo], da exposição [COMPLEMENTO
INDIRECTO]; *as crianças ficaram [Verbo],
no parque [COMPLEMENTO ADVERBIAL OBRIGATÓRIO]). Pela mesma
lógica, o mesmo se aplica aos complementos seleccionados por substantivos (ex.
* foi a casa, dos avós), por adjectivos (ex.: *estava
impaciente, por sair) ou por advérbios (*lava as mãos antes,
das refeições), que não deverão ser separados por vírgula da palavra que os
selecciona.
Há, no entanto, alguns contextos em que pode haver entre o sujeito e o verbo uma estrutura sintáctica separada por vírgulas, mas apenas no caso de essa estrutura poder ser isolada por uma vírgula no início e no fim. Estes são normalmente os
casos de adjuntos nominais (ex.: o rapaz, menino muito magro, comeu muito),
adjuntos adverbiais (ex.: o rapaz, como habitualmente, comeu muito),
orações subordinadas adverbiais (ex.: as pessoas que estiveram na exposição,
apesar das más condições, gostaram muito), orações subordinadas relativas explicativas (ex.: o rapaz, que até não tinha fome,
comeu muito).
Na frase: Nós convidámo-vos, o pronome é enclítico, o que obriga à omissão do -s final na desinência -mos ao contrário do que o V. corrector on-line propõe: Nós convidamos-vos, o que, certamente, é erro. Nós convidamos-vos, Nós convidámos-vos, Nós convidamo-vos, Nós convidámo-vos: afinal o que é que está correcto?
A forma nós convidámos-vos encontra-se correcta, tal como é verificado pelo FLiP on-line.
A forma *nós convidámo-vos corresponde a um erro muito
frequente dos utilizadores da língua, por analogia com o uso enclítico do
pronome nos (como em nós convidámo-nos); apesar de aparentemente
semelhantes, estes dois casos correspondem a contextos diferentes que
determinaram a grafia actual. Em casos como nós convidámo-nos, estamos
perante a terminação da primeira pessoa do plural -mos, seguida do
clítico nos; estas duas terminações são quase homófonas, pelo que a
língua encontrou uma forma de as dissimilar ou diferenciar, num fenómeno
designado “dissimilação das sílabas parafónicas” por Martins de Aguiar, citado
por CUNHA e CINTRA na Nova Gramática do Português Contemporâneo (Ed. João
Sá da Costa, 1998, p. 318). No caso de nós convidámos-vos não há
necessidade de dissimilação, pelo que a grafia deverá incluir o -s final
da desinência da primeira pessoa do plural.
Relativamente ao uso dos clíticos e às alterações ortográficas que estes
implicam quando se seguem à forma verbal (ênclise), pode dizer-se que não há
qualquer alteração ortográfica com os pronomes pessoais átonos que são complemento
indirecto (me, te, lhe, vos, lhes), excepto com o pronome nos, que
provoca a já referida redução da forma verbal da desinência da primeira pessoa
do plural (de *-mos-nos para -mo-nos). A este respeito, veja-se o
anexo relativo aos verbos no Dicionário Houaiss da Língua Portuguesa
(Círculo de Leitores, 2002) ou 12 000 verbes portugais et brésiliens - Formes
et emplois (“Collection Bescherelle”, Paris, Hatier, 1993), duas das poucas
obras de referência que explicitamente referem este fenómeno.
Em relação aos clíticos de complemento directo (o, a, os as), quando há
ênclise apresentam alteração para -lo, la, -los, -las se se seguirem a
forma verbal terminada em -r, -s ou -z ou ao advérbio
eis, sendo que há redução da forma verbal (ex.: convidá-lo,
convidamo-las, di-lo, ei-la), por vezes com necessidade de acentuação
gráfica (ver também outra dúvida sobre este assunto em
escreve-lo e escrevê-lo). Se a forma verbal terminar em nasal (ex.: convidam, convidaram), o pronome
enclítico altera-se para -no, -na, -nos, -nas (ex.: convidam-no,
convidaram-nas).
As construções *nós convidamo-vos e *nós convidámo-vos estão então
incorrectas, pois não há motivo para retirar o -s à terminação da
primeira pessoa do plural quando seguida do clítico vos. No português europeu, as construções
nós convidamos-vos e nós convidámos-vos estão ambas correctas,
distinguindo-se apenas pelo tempo verbal. A primeira corresponde ao presente do
indicativo (ex.: Hoje convidamos-vos para uma visita às grutas) e a
segunda ao pretérito perfeito do indicativo (ex.: Ontem convidámos-vos para um
passeio de barco).