Como se classifica gramaticalmente a forma levemo-lo?
Gramaticalmente, levemo-lo corresponde a uma forma do verbo levar na primeira pessoa do plural do imperativo (ex.: amigos, levemos isto daqui já), seguido do pronome átono o, que assume a forma -lo por estar a seguir
a uma forma verbal terminada num -s (que desaparece: levemos +
o = levemo-lo).
A forma levemos, isoladamente, poderá corresponder também ao presente do conjuntivo (ex.: é preciso que levemos isto daqui), mas, como tem o pronome átono em posição
enclítica (depois do verbo), não corresponde a esse tempo, pois o presente do conjuntivo é normalmente antecedido da conjunção que, com propriedades de atracção do pronome átono (ex.: é preciso que o levemos
daqui), não sendo considerada gramatical uma construção proclítica nesse
caso (ex.: *é preciso que levemo-lo daqui).
Na frase "Quem encontrou uns óculos no banheiro, favor entregar ao setor de Meio Ambiente", a dúvida é se posso colocar uns óculos, mesmo possuindo um único par de óculos perdidos.
A concordância uns óculos está correcta e *um
óculos é um erro a evitar (o asterisco indica agramaticalidade).
O exemplo apontado (óculos)
é um caso de pluralia tantum (‘apenas plural’), designação latina dada a
palavras ou expressões que correspondem a um plural gramatical, mas que designam
um objecto ou referente singular, normalmente formado por duas partes mais ou
menos simétricas (outros exemplos serão binóculos ou calças). Com
estas palavras tem de haver sempre concordância com a terceira pessoa do
plural (ex.: os binóculos partidos estão
em cima da mesa; as calças rasgadas foram
cosidas), pois gramaticalmente são substantivos no plural,
mesmo se designam uma realidade única; é também frequente nestes casos o uso do
numeral colectivo par de, o que permite fazer concordâncias no singular
(ex.: o par de binóculos partidos/partido está
em cima da mesa; o par de calças rasgadas/rasgado foi
cosido).
A hesitação na utilização da palavra óculos parece resultar de dois
factores. O primeiro factor relaciona-se com a influência de um fenómeno
relativamente comum no português do Brasil, que consiste na preferência do
singular para designar um referente composto por duas peças (ex.: Comprei uma
calça nova; Está usando sandália importada), sem que a interpretação
implique apenas um elemento do par (repare-se no entanto que as formas *uma
calças / *umas calça e *uma sandálias / *umas sandália
são incorrectas, como indica o asterisco). O segundo factor, como refere Cláudio
Moreno em O Prazer das Palavras (Porto Alegre, RBS Publicações, 2004, p.
122), relaciona-se com o facto de óculos não ser entendido como plural de
óculo e ser confundido com um substantivo de dois números (isto é, que
tem a mesma forma para o singular e para o plural) terminado em -s, como
lápis (ex.: Comprei um lápis novo; Está usando lápis importados).
Estes dois factores conjugam-se na construção de estruturas erradas como *meu
óculos escuro.